As quatro estações


Charmoso como a primavera, quente como o verão, fechado como o outono e impassional como o inverno. Era assim que ele aparecia de tempos em tempos e era assim que trocávamos nossa energia de forma intensa e momentânea. Eu pensei que já havíamos passado por todas as estações quando nos afastamos, mas eis que ele retornou.

Mas dessa vez foi diferente, ele veio machucado, calmo como águas rasas e um tanto quanto indignado de como seus defeitos não foram capazes de conquistar uma rara donzela alheia. Ele veio cabisbaixo por falhar em um dos seus raros momentos de guarda baixa, onde se dobrou e aceitou que poderia de fato se envolver com alguém.

Chegou em minha casa e entrou, pela primeira vez, com a mesma familiaridade das nossas amistosas conversas que já duravam quase dois anos. Mas ele não veio como amigo, tampouco como companheiro, ele veio embalado pelas velhas lembranças que cercavam a sua mente. Bem, eu já sabia disso e ainda sim permiti a sua entrada. A intenção era de nos usássemos e abusássemos como só nós, com nossa energia latente, sabíamos fazer!

Eu poderia dizer que foi bom, mas não foi. Ainda havia intensidade, mas não fluidez. Era como se houvesse apenas um movimento unidirecional para satisfazê-lo, sem, necessariamente, uma troca, sem entrega da outra parte; e isso foi muito desgastante!

Parte disso é minha culpa, confesso. Ele veio em nome das boas lembranças e eu havia me esquecido de parte delas. Com ele, sempre me senti no olho do vulcão: me ardia em nossos desejos e depois me sentia queimada. Era tão intenso em sensações como vazio no após. Ainda assim, havia combustão.

Mas dessa vez sequer houve prazer, e ele se foi. Se foi com a mesma desculpa do desapego que entremeia todas as nossas estações, nossos encontros e desencontros. E eu deixei-o ir. Não há outra escolha; se o medo da intimidade é uma questão não sou eu que vou pedir para ficar.

Ainda assim não me arrependo de nenhum dos nossos encontros. Ele mexeu com meus sentidos, ativou meu senso crítico e marcou o início de uma nova fase. Se ele tem um pouco de mim, ainda que só faíscas de lembranças, eu tenho o cultivar de uma nova mulher. Passei por cada fase, paciente, desfrutei do processo, fiz as podas necessárias, floresci.

Ele escolheu a impassionalidade do inverno e eu o calor do verão. Não temos outra escolha senão o afastamento; estamos em hemisférios opostos. Ainda nos encontraremos? Dificilmente. Sou muito grata por todos os nossos verões, outonos, invernos e primaveras que me fizeram aproveitar de forma despretensiosamente deliciosa cada momento, mas que também me mostraram que há hora para partir. Ele teve a sua importância, a minha atenção e o meu carinho. Mas, hoje, o que me faz querer ficar, é o que me aquece e acalenta, não só o corpo, mas também o coração.

A Pequenininha

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