Meu querido ego

“Era tão pobre, mas tão pobre, que só tinha dinheiro; tão ignorante, que só tinha inteligência; pensava ser tão completo, que só tinha o inflar do seu ego.”

Uma vez um menino me disse que eu mentia pra mim mesma, tentando acreditar numa coisa que não era para tentar me sobressair. Pobre coitado, como se atreve a tal imbecilidade?!

Por tal vacilo pisei no coração do dito cujo com vontade; ou pelo menos acho que o fiz ou tive a intenção de fazer. Ele mexeu com meu ego, tentou quebrar as minhas defesas e isso não se faz! Quando se é movido por tal sentimento você não tem muita compaixão, apenas quer que o outro sinta da mesma forma, ou até mais intensamente, o que é ter uma ferida tocada. Aquilo não era verdade, sequer a pessoa me conhecia direito... e creio que, depois do ocorrido, talvez tenha pensado, pelo menos por um breve momento, o quão bom seria se nunca tivesse me conhecido e passado por tal transtorno.

Apesar de infundadas frases aquilo me chateou. Senti-me no direito de vingança pelo atrevimento de me afetar. Meu ego crescia com a necessidade de me valorizar, de destacar as minhas qualidades em detrimento das fragilidades, pra que ninguém fizesse tal mal feito novamente. Confesso que tenho alcançado grande êxito no empreendimento; palmas para mim que nunca fui tão egocêntrica como nos últimos tempos!

As pessoas não entendem que quando elas ou demais se sentem sozinhas procuram se refugiar em si mesmas. Passam a criar defesas, modelos em constante aperfeiçoamento, que procurem protegê-las dos perigos do mundo quando acham que ninguém mais pode fazer isso por elas. O que as sustenta é o ego, o orgulho de si mesmas, de conseguirem a cada dia passarem suas fraquezas despercebidas, e ao mesmo tempo se inflar com a capacidade de transparecerem a imagem que tentam construir com suas habilidades autônomas: uma muralha cada vez mais forte para proteger pessoas que podem estar cada vez mais frágeis.

Entendam, eu não sou uma pessoa má (pelo menos não em essência), mas também passo longe de ser uma pessoa boazinha. Eu poderia dizer que sou uma pessoa boa, que tenta se sobressair a cada dia, se superar a cada momento com as ferramentas que me são disponíveis. Eu tenho capacidades e é nelas que tenho que focar para formar o que sou, e não olhar somente para as fraquezas que me apontam e julgá-las como verdadeiras ou sendo o meu todo.

Querem adentrar na defesa de alguém pra saber realmente o que se encontra em seu interior? Ame-as verdadeiramente, querendo que os segredos delas sejam os seus, querendo que as fraquezas e qualidades fortes dela também sejam compartilhadas com as suas. Não fiquem tentando adivinhar o que há dentro do baú do tesouro, chutando sobre as coisas boas ou ruins que podem estar lá. Busquem ter a confiança de conseguirem a chave e depositem o seu tesouro também ali, quando conseguirem ter acesso ao interior. Sejam inteligentes, saibam somar riquezas! Outra dica valiosa é de que nunca, nunca tente arrombá-lo! Você não tem o direito de abrir algo que não lhe é confiado. Conteúdos frágeis e especiais podem se perder se não cuidarmos bem do seu recipiente.

Pensando bem, eu acho que não queria ter magoado aquele menino, mas de maneira alguma poderia permitir que ele me tirasse algo tão valioso e delicado: o amor que tenho por mim mesma! E nestas horas, caros leitores, não tem como ser boazinha e compassiva quando o que está em jogo é garantir-se de pé.

Eu sou uma edição limitada de um conteúdo frágil e delicado coberto por uma embalagem criada por mim mesma, cada vez mais bem protegida. Meu tesouro é compartilhado com aqueles que também dividem suas riquezas comigo, meu amor é dedicado para aqueles que acreditam em mim e impulsionam o meu crescimento. É claro que meu amor pode crescer mais, e eu até o quero, mas é preciso amadurecer na mesma proporção e ter um destinatário para tal produção. Meu ego também poderá ser menos intenso, assim que eu perceber que não ficarei desamparada se um dia me desprender de parte desta enorme cobertura que me envolve e protege.

Acreditem, eu não quero ser tão pobre que só tenha dinheiro, nem tão ignorante que só tenha inteligência. Eu quero viver, e conviver; quero que outros, além de mim, tenham a oportunidade de conhecer os tesouros que tenho cultivado. Que um dia Deus me conceda alguém que cuide e valorize o meu tesouro como se fosse seu, e que eu tenha a capacidade de fazer o mesmo por ele. Muitas águas correrão até este momento... mas as correntezas hão de me ensinar alguma coisa neste processo!

De uma menina ainda muito egoísta... A Pequenininha.

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